quarta-feira, 21 de junho de 2017

O PERIGO DO PROFILING



De acordo com Luiz Costa - Procurador da República e fundador do Grupo de Trabalho Tecnologias da Informação e Comunicação do MPF. É formado em Direito pela PUC/SP e mestre em Direito da Internet pela Universidade de Paris I - Panthéon Sorbonne - No jargão tecnológico, “profiling” é a utilização de algoritmos complexos para criar modelos ou perfis – que tem caráter geral – a partir de dados específicos. Esses algoritmos processam enormes quantidades de informação e fazem correlações entre dados inicialmente desconexos (por exemplo, dados de conexão, biométricos, demográficos, entre outros), a partir do que um perfil é criado e aplicado.
A essa altura já é possível estimar que o uso de técnicas de “profiling” na Internet e fora dela pode estar na raiz de justas preocupações, e aqui destaco duas dimensões. A primeira é mais geral e está ligada ao amplo uso que empresas e governos têm feito dessas técnicas com os mais variados fins (os exemplos aqui são uma pequena amostra), bem como ao desequilíbrio entre, de um lado, o conhecimento e benefícios diretos que as organizações tiram do “profiling” e do outro lado uma extrema falta de transparência para o público em geral sobre como essas técnicas são utilizadas. Assumindo que uma das funções da lei é justamente a de promover justiça em relações de poder desequilibradas, a segunda dimensão – jurídica – fica evidente.
 O articulista Cláudio de Moura Castro tratou em sua coluna do tema “Profiling”:   “Palavra da língua inglesa que significa um critério de decisão subjetivo, levando o indivíduo a decidir baseando-se não em uma racionalidade perfeita, mas em um impulso originado e decorrente de seus valores pessoais”. O exemplo emblemático dado pelo articulista foi o do professor de Harvard que, sem a chave de sua casa, estava em seu jardim, tentando arrombar a janela, quando foi preso por um policial americano, não obstante todos os seus argumentos. Um detalhe chamava a atenção: o policial era branco e o dono da casa era negro. Vários exemplos podem ser extraídos do cotidiano: a) o fiscal da alfândega que examina determinada pessoa porque a aparência da mesma se enquadra no perfil de “muambeiro” que o fiscal tem em mente; b) o administrador que seleciona o estagiário pela aparência, por ser a aparência um critério que ele possui como indício de competência; c) o motorista que seleciona suas caronas por um determinado perfil, excluindo outros perfis, geralmente para não correr risco de ser assaltado; d) o agente de aeroporto que revista pessoas que se enquadrem aparentemente no perfil de terrorista, ainda que esteja longe de ser um.
Não menos interessante foi a entrevista, dada pelo psicólogo Walter Mischel, nas páginas amarelas do mesmo periódico (Revista Veja). Esse renomado estudioso do comportamento humano, idealizou e realizou o experimento chamado “O Teste do Marshmallow”, lançando agora livro com o mesmo nome. Referido teste tinha por objetivo estudar os mecanismos do autocontrole. Aprofundando os estudos a partir da realização do teste, Walter Mischel defende que o autocontrole é conseguido quando a região cerebral conhecida como córtex pré-frontal consegue se sobrepor aos impulsos instintivos emanados do sistema límbico. Um indivíduo sem o devido autocontrole geralmente é refém de impulsos do sistema límbico que prevalecem sobre a racionalidade radicada no córtex pré-frontal. Por outro lado, um indivíduo ponderado, com grande autocontrole, consegue suprimir esses impulsos instintivos e reagir com a racionalidade típica da análise feita a partir do córtex pré-frontal.
Conjugando-se todas as informações, é possível se concluir que geralmente as decisões conhecidas como profiling decorrem de impulsos instintivos que se sobrepõem à racionalidade. Não se trata de algo incomum, vez que estas decisões são comuns à própria vida em sociedade, necessárias, desde tempos imemoriais, à própria sobrevivência do indivíduo. Quando o motorista evita dar carona a alguém que, em sua concepção, aparenta ser uma pessoa perigosa, age com instinto de preservar a si e ao seu patrimônio. O mesmo acontece com o empregador que rejeita um empregado ao julgá-lo por sua aparência desleixada, por temer que esse desleixo seja uma característica de sua forma de trabalhar.
Segundo o Articulista Moura Castro significa um critério de decisão subjetivo levando o indivíduo a decidir baseando-se não em uma racionalidade perfeita, mas em um impulso originado e decorrente de valores pessoais.
Ele articula que como receita para enfrentar decisões do cotidiano, o profiling é inevitável. Mas, obviamente, há que ter extremo cuidado para que um julgamento prematuro não resulte em injustiça, discriminação ou equívocos dramáticos. Isso aconteceu com o eletricista brasileiro fuzilado pela polícia de Londres, iludida, ao vê-lo correr e pular a catraca.
Resumindo: É ingênuo dizer que não devemos mais decidir usando as probabilidades condicionais (o famigerado profiling). Segundo ele, o cuidado é antes de agir, considerar a gravidade de um eventual erro.

Fontes: Furlan, Anderson – Gazeta do Povo – 01/06/2016
              Moura Castro, Claudio de – Revista Veja – 01/06/2016


Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradeceria se você deixasse sua mensagem.

Related Posts with Thumbnails